top of page
Dia do Dharma

Dentre os festivais budistas que incluem os eventos mais significativos na vida do Buda, tais como o Seu aniversário de nascimento e o Dia do Parinirvana encontra-se o dia em que Ele primeiro ensinou o Dharma (Dia do Dharma).

O Dharma, a verdade ensinada pelo Buda, se desdobra de modo gradual. Em muitas ocasiões Ele deixou claro que a iluminação não ocorre como se fosse um relâmpago, de maneira inesperada para a mente destreinada e despreparada. Ao invés disso, a iluminação é a culminação de uma longa jornada com muitas etapas. A mente se desenvolve de forma gradual até que esteja suficientemente madura para realizar o salto repentino para a iluminação.

“Da mesma forma como o oceano tem bancos de areia graduais, um declive gradual, uma inclinação gradual, com uma queda abrupta somente após um longo trecho, assim também esta Doutrina e Disciplina tem um treinamento gradual, um desempenho gradual, uma progressão gradual, com uma penetração do conhecimento somente após um longo percurso.” (Ud V.5)

“Bhikkhus, eu não digo que o conhecimento supremo é alcançado todo de uma vez. Ao contrário, o conhecimento supremo é alcançado através do treinamento gradual, através da prática gradual, através do progresso gradual.” (MN 70)

Dhamma-Cakkappavattana-Sutta - Primeiro Discurso do Buda

Sidarta Gautama, o Buda, pôs em movimento a Roda do Dharma pela primeira vez em Varanasi (Benares), cidade situada perto do rio Ganges. Naquele momento, enunciou o primeiro ciclo de Seus Ensinamentos diante dos cinco “rishis”, ou os cincos iogues que tinham acompanhado o Buda durante os primeiros momentos de seu desenvolvimento espiritual. Diante desses cinco ascetas e de uma assembleia de seres divinos, promulgou as “Quatro Nobres Verdades”, dirigindo-se a eles da seguinte forma:

“O tathagata, irmãos, o bendito, o plenamente iluminado, em Isipatana, no Parque das Gazelas em Benares, estabeleceu o supremo reinado da verdade, e ninguém pode suportá-la, e o fazer conhecer, assinalar, expor, revelar é explicar, é tornar evidente as Quatro Nobres Verdades”.

"E o que são estas Quatro Nobres Verdades?”

  • a nobre verdade do sofrimento;

  • a nobre verdade da causa do sofrimento;

  • a nobre verdade do fim do sofrimento, e;

  • a nobre verdade do caminho que leva à extinção do sofrimento (o Nobre Caminho Óctuplo).

 

E o bendito falou:

“Irmãos, enquanto Meu conhecimento e intuição no que diz respeito às Quatro Nobres Verdades não eram muito claros, duvidava que tivesse alcançado uma completa intuição deste conhecimento, o qual não é superado nem no céu nem na terra, que não tem referência entre todas as grandes quantidades de ascetas e sacerdotes, de seres invisíveis e homens comuns. Porém, irmãos, quando Meu conhecimento e intuição no que diz respeito a cada uma das Quatro Nobres Verdades chegaram a ser perfeitamente claros, surgiu em Mim a segurança de que tinha atingido uma compreensão completa deste conhecimento.

Por este motivo, irmãos, que é a Nobre Verdade do Sofrimento? Nascer é sofrimento, decair é sofrimento, morrer é sofrimento, a pena, o lamentar-se, a dor, o pesar e o desespero – tudo isso é sofrimento. Os cinco agregados da existência são sofrimento.

Mas, irmãos, o que é nascer? A concepção, a germinação, a manifestação dos agregados e do surgimento da atividade sensorial – isto é nascimento.

O que é, irmãos, decair? É envelhecer, é murchar, é a decrepitude, é ficar com cabelos brancos, é o esvaziar da força vital, o enfraquecimento dos cinco sentidos – isto é decair.

O que é, irmãos, a morte? É a separação, o desaparecimento, o desgarramento, a ruína, a dissolução, o fim do período vital, o fim dos cinco agregados da existência, a putrefação – isto é a morte.

O que é, irmãos, a pena? Tudo o que, através desta ou outra perda ou infortúnio que se padece, produza preocupação, aflição, desespero interno é padecer.

O que é, irmãos, a lamentação? Tudo o que, através desta ou daquela perda que se padece, produza queixa, lamento, gemidos – isto é lamentação.

O que é, irmãos, a dor? Tudo o que é desagradável e penoso para o corpo, as feridas, as chagas, os cortes, o pus – isto é chamado de dor.

O que é, irmãos, o pesar? Tudo o que é doloroso para a mente, desagradável para a mente – isto é pesar.

O que é, irmãos, o desespero? É a consciência da perda, é o padecer que se experimenta, é o desalento, a impotência – isto é chamado de desespero.

O que é, irmãos, o sofrimento de não conseguir o que se deseja? É, ao termos consciência de todos os problemas e aflições humanas, exclamar: “Oh, se não tivéssemos diante de nós o decair, a doença, a morte, a dor, o lamento, o padecer, o pesar e o desespero!” Porém, não se pode conseguir isto somente pelo mero desejo. Por isso, não conseguir o que se deseja é sofrimento.

O que são, pois, irmãos, os cinco agregados da existência? São a existência material, o sentimento, a percepção, as diferenciações subjetivas e a consciência.

Existem três tipos de sofrimento:

  • o primeiro é sutil e está em todos os seres vivos; é o fundamento da existência;

  • o segundo é o sofrimento produzido pela eterna mudança, a impermanência, e;

  • o terceiro é conhecido como o sofrimento do sofrimento, ou seja, a dor concreta que experimentamos quando nosso corpo material sofre.

 

O que é, irmãos, a Nobre Verdade da Origem do Sofrimento?

É o desejo que dá surgimento a um novo renascimento que, amarrado pela sede de prazer, ora aqui, ora acolá, sempre encontra um novo deleite. Esta sede que constantemente nos impele a agir possui três manifestações:

  • a primeira é a sensual;

  • a segunda e a de existência individual, e;

  • a terceira é a de autoaniquilação.

 

Porém, irmãos, onde tem origem esta sede? Onde ela surge?

Os olhos, o ouvido, o nariz, a língua, o corpo e a mente, todos são agradáveis e causam prazer para os homens.

As formas, os sons, os odores, os sabores, os contatos corporais e as ideias são agradáveis e causam prazer aos homens.

 

A consciência que se origina mediante o contato dos olhos, do ouvido, do nariz, da língua, do corpo e da mente é agradável e causa prazer aos homens.

As sensações que surgem do olhar, do escutar, do cheirar, do saborear, do tocar e do pensar são agradáveis e causam prazer aos homens.

 

A percepção das formas, dos sons, dos aromas, dos sabores, dos contatos corporais e das ideias são agradáveis e causam prazer aos homens.

Pensar e refletir sobre as formas, os sons, os aromas os sabores, os contatos corporais e sobre as próprias ideias torna-se agradável e causa prazer aos homens.

Assim, irmãos, quando o ser experimenta ou contempla uma forma com os olhos, escuta os sons, sente o cheiro de uma fragrância, experimenta um sabor com a língua, sente um contato com o corpo, experimenta uma idéia com a mente, se estas percepções, irmãos, resultarem prazenteiras, então o sentido de agradável aparece e, se forem desagradáveis, aparece o sentido da aversão.

Agora, seja qual for o sentimento que apareça (bom, mau ou neutro), ele sempre é aprovado e o homem sempre se apega imediatamente a ele. O ato de apegar-se é o ato de atar-se à existência e à causa do futuro nascimento; o nascimento dá origem à decadência e à morte, ao padecer, à lamentação, ao pesar e ao sofrimento impulsionado, em verdade, pelo desejo sensual. Somente por este vão desejo, os reis fazem guerra aos outros reis; os príncipes, aos outros príncipes; os sacerdotes, aos sacerdotes; os cidadãos, aos cidadãos; a mãe, ao filho; os irmãos, entre si, e os amigos tornam-se inimigos.

Assim, entregues a esta discórdia contínua, os homens se ferem mutuamente com paus, pedras, facas e armas de todo tipo. Procuram a morte rapidamente; causam a morte rapidamente; afundam os seres que teriam que amar nas piores misérias. Todos estes sofrimentos, irmãos, têm como causa somente o desejo sensual. Ademais, irmãos, por causa deste desejo, as pessoas rompem os contratos, roubam os bens uns dos outros, furtam, traem, seduzem as mulheres casadas, andam pelo mau caminho em palavras, pensamentos e atos que as acompanham até depois da morte e as fazem cair em estados de existência onde, cada vez mais, passarão por sofrimentos insuportáveis. Porque se disse: “Nem no ar, nem no mais profundo dos oceanos, nem nas cavernas das montanhas, nem em parte alguma encontrarás um lugar onde possas estar livre dos maus atos.”

O que é, irmãos, a Nobre Verdade da Cessação do Sofrimento?

É a completa extinção do desejo. É rejeitar o desejo. É libertar-se dele. Porém, irmãos, como este desejo chega a desaparecer? Há três formas:

  • refletindo profundamente sobre o próprio infortúnio;

  • refletindo sobre o infortúnio dos outros, e;

  • refletindo sobre o infortúnio próprio e dos outros.

 

Assim, refletindo profundamente sobre o infortúnio e sobre as causas do infortúnio, os homens compreendem que a raiz de seus males está na sede sensual. Derrotando esta sede, o homem não experimenta sofrimento mental, nem angústia, nem dor. Este é o nirvana visível nesta vida, acessível ao discípulo sábio.

O que é, irmãos, a Nobre Verdade que Conduz ao Fim do Sofrimento?

Ó, irmãos, existem dois extremos que devem ser evitados por aqueles que procuram a liberação do sofrimento. E quais são estes? Um é o apego aos prazeres mundanos, às paixões e aos deleites; o que é vão, vulgar e ignóbil. O outro é a mortificação de si mesmo; o que é doloroso, vão, vulgar e ignóbil.

Evitando estes dois extremos, irmãos, o Buda percebeu o caminho do meio, o qual produz a percepção interior, confere o Conhecimento e conduz à calma, à Suprema Sabedoria, à Iluminação interior, ao Nirvana.

E qual é o caminho do meio, irmãos?

“É o Nobre Caminho Óctuplo, que se forma pela compreensão correta, pela intenção correta, pela palavra correta, pela atenção correta, pelo viver correto, pelo esforço correto, pela aplicação correta e pela meditação correta.”

Diz o Senhor Buda: “O que é, pois, irmãos, a compreensão correta?”

Quando o discípulo compreende o mal e a raiz do mal, compreende o bem e a raiz do bem – isto, irmãos, é a reta compreensão. O que é, irmãos, o mal? Matar, furtar, ter relações sexuais desonestas, mentir, caluniar, usar linguagem irada, falar sem sentido, cobiçar o alheio, opinar equivocadamente – todos estes fatores são o mal.

E qual é a raiz do mal? A cobiça, a ira e a ilusão são a raiz do mal.

E qual é a raiz do bem?

Estar livre da cobiça, da ira e da ilusão são a raiz do bem.

Ademais, irmãos, quando o discípulo compreende o sofrimento, a causa do sofrimento e o caminho que leva ao fim do sofrimento – isto, irmãos, é reta compreensão.

Quando o discípulo observa que a forma, o sentimento, a percepção, as tendências e a consciência são transitórias, possui a reta compreensão. Mas, se alguém dissesse: “Não quero seguir estes ensinamentos, a não ser que o Buda me fale se o mundo é temporal ou eterno, se o mundo é finito ou infinito, se a personalidade é idêntica ao corpo, se a personalidade e a alma são diferentes ou idênticas, se o Buda continua existindo ou não depois da morte, se a alma é imortal ou se perece junto com o corpo”, tal pessoa, irmãos, morrerá antes que o Buda possa lhe explicar tudo isso. É como se um homem fosse atravessado por uma flecha envenenada e seus amigos e familiares procurassem um médico, e ele falasse assim: “Não quero que tirem esta flecha enquanto não conhecer o homem que me feriu, a casta a que pertence, seu nome, sua família, se ele é alto ou baixo”, irmãos, seguramente este homem morrerá sem que possa chegar a saber tudo isso, porque, existindo ou não estas teorias, é certo que há nascimento, decadência, envelhecimento, doença e morte, lamentação, sofrimento, pesar e desespero.

O que é, pois, irmãos, a intenção correta?

O pensamento livre de sensualidade; o pensamento livre da má vontade e o pensamento livre da crueldade.

O que é, pois, irmãos, a palavra correta?

É quando, irmãos, o homem venceu a mentira, venceu a falsidade. Diz a verdade, é devoto da verdade, é digno de confiança, não engana as pessoas. Quando é levado perante um juiz e o mesmo lhe pergunta: “Vamos, bom homem, fala o que sabes”, responde, se nada sabe, “nada sei” e, se sabe, “sei”; se nada viu, responde “nada vi” e, se viu, responde “vi”. Assim, nunca diz mentiras conscientemente, nem por proveito próprio, nem por proveito de outra pessoa, nem por amor a proveito algum. É quando o homem venceu a calúnia e não perjura.

O que escutou aqui, não repete lá, para, assim, não ser causa de desentendimentos nem de brigas. Torna-se elemento reconciliador, alegra-se na concórdia, e a difunde com suas palavras. Renunciou à linguagem irada, usa palavras suaves aos ouvidos, palavras que despertam o amor no coração das pessoas, palavras que são corteses, que deixam felizes aos muitos e que elevam a muitos. Venceu a conversa ociosa, fala no momento justo e de acordo com os fatos. Fala somente do Dharma ou guarda santo silêncio. Fala dos fatos dos grandes mestres e estimula a que sigam Seus exemplos. Sua fala é tida como de muito valor, e não contradiz seu pensamento.

 

O que é, pois, irmãos, a ação correta?

Irmãos, este homem renunciou a matar de qualquer forma, seja com as mãos ou com armas.

Este homem é compassivo, solidário, ama a bondade e tem piedade de todos os seres vivos.

Renunciou ao furto e ao roubo, pega somente o que lhe foi dado, guarda o que lhe foi encomendado a guardar  e evita apoderar-se de qualquer objeto que não lhe pertença.

Renunciou a qualquer tipo de relação sexual desonesta, não seduz mulheres casadas, não tem relações sexuais perto das moradias de homens santos ou de discípulos que estejam meditando, nem perto ou dentro de lugares considerados santos. Não tem relações sexuais com comerciantes de sexo, nem com crianças. Isto, irmãos, é chamado de ação correta.

 

O que é, pois, irmãos, o viver correto?

O correto viver, ou o correto meio de vida, é abster-se dos cinco tipos nefastos de comércio: o de armas, o de seres vivos, o de carne, o de bebidas embriagadoras, o de drogas e o de venenos. Enfim, o modo de vida correto inclui ser honesto no trabalho que se esteja realizando e obter o sustento da forma mais honesta possível.

O que é, pois, irmãos, o esforço correto?

Há, irmãos, quatro grandes esforços:

  • O esforço de evitar, que é estar atento e gerar em si mesmo a vontade de vencer o mal e as coisas impuras que ainda não tenham surgido. E esta pessoa, invocando suas forças, luta e esforça-se para manter a mente constantemente alerta, para que os pensamentos, palavras e atos errôneos não se materializem;

  • O esforço de vencer, que é estar atento e conceber em si mesmo a vontade de vencer o mal e as coisas impuras que já tenham surgido. E esta pessoa, invocando todas as suas forças, luta e incita sua mente a vencer;

  • O esforço de desenvolver, que é estar constantemente dirigindo sua mente para desenvolver pensamentos positivos, de amor de concórdia, para desenvolver estados de constante atenção, para evitar ou aniquilar estados mentais que não estejam de acordo com a compaixão, a cordialidade, o amor ao próximo, e;

  • O esforço de manter, que é, estando em alerta na supressão de estados mentais negativos e desenvolvendo estados mentais positivos, a pessoa tenta constantemente manter a mente em harmonia com seu meio ambiente e com todos os seres, com a finalidade de desenvolver uma mente calma.

 

O que é, pois, irmãos, a aplicação correta?

É, irmãos, quando o discípulo venceu os desejos humanos e vive em contemplação do corpo, das sensações, da mente, dos fenômenos internos de forma incansável e claramente consciente, com os sentidos despertos. A correta aplicação dos quatro fundamentos detalhados anteriormente conduz o homem à realização da pureza, à superação da dor e da lamentação, ao fim do sofrimento e do padecer e, por fim, ao nirvana.

O que é, pois, irmãos, o correto samadhi?

Fixar a mente num ponto – isto é samadhi.

Os quatro fundamentos da aplicação – estes são os objetos do samadhi.

Os quatro grandes esforços – estes são os meios necessários para o samadhi.

Praticar, cultivar e desenvolver estes aspectos – isto se chama “desenvolver o samadhi”.

bottom of page